A 1200 metros de altitude, a Levada do
Alecrim inicia-se na zona do Rabaçal no concelho da Calheta. É uma caminhada
que se faz sem muita dificuldade, num terreno regular, tirando uns degraus
junto a uma desafiante e bela queda de água. Aliás, a água é o elemento primordial
que nos acompanha e que se manifesta em sons vivos e dispersos. A paisagem
concede-nos uma massagem ocular que nos transporta para um mundo místico de sedutoras
súcubos escondidas na luxuriante vegetação. É uma levada para se caminhar com
tempo. No final, o pulmão e o coração abertamente agradecidos fazem-nos sorrir como se estivessemos um pouco mais novos.
O percurso tem uma extensão de 6.8.km, ida e volta, que se completam em 2h:30m,
num ritmo calmo e contemplativo.
Tenho amigos optimistas. Confesso estava de nervos espicaçados, a
rogar pragas a quem tinha dito que eram 3 quilômetros sempre a direito, cheios
de bichinhos por todo o lado, a saltar à nossa frente, contudo, até aqui, o que
tinha observado foram urzes, magníficos líquenes e musgos, suportados por uma
paisagem assombrosa, contudo faltavam os bichos. Quando nisto tudo mudou. Mais valia estar calado,
silêncio e humildade só fazem bem. Mas já era tarde demais, o mau feitio
de vinagrete parvo já tinha transbordado em birra e tive que engolir as pragas
e o azedume, quando vi um perfeito encanto esvoaçante.
Aos meus pés uma pequena ave colorida pulava irrequieta. Era a bis-bis (Regulus
Madeirensis). Foi um momento de cumplicidade único. O bicho cercava-nos,
nunca parou de ramo e ramo, entre o solo e os arbustos, mas colaborou ao ponto
de quase pousar na cabeça de um dos meus amigos. Houve momentos em que não
conseguia focar, de tão perto que a ave estava da objectiva. Foi a comunhão
entre a natureza e uns simples caminhantes que por ali cirandavam atarantados. A
admiração que ficámos por uma das mais pequenas aves da Europa foi
inesquecível. A bis-bis parecia estar a apresentar-nos a Levada do Alecrim,
onde ela reinava como estrela maior.
Mais à frente, quando
chegámos à Lagoa da Dona Beja, encontrámos este tentilhão da Madeira (Fringilla
coelebs ssp. maderensis). Trata-se de uma ave endémica do arquipélago da
Madeira e da Macaronésia; é uma subespécie do tentilhão-comum. Foi um fiel companheiro
durante as nossas caminhadas por esta levada e pela floresta Laurissilva.
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