Pelas escadas sobe o silêncio marmóreo,
espero ouvir o barulho das chaves,
acompanhado pelo pigarrear da tua chegada,
mas a porta não voltará a abrir-se,
pelas mãos calejadas
de quem carpintejou na perfeição a madeira,
procurarando a janela mais próxima deste céu.
Cá por casa...
o tempo faz-se lento,
sobra o eco dissonante da tua falta,
o cristalino azul dos teu olhos - doce mar,
sem rotinas, os objectos assumem-se tristes,
de manhã, a torradeira já não te chama,
com o pão dourado a pingar manteiga,
à tarde, os tapetes alinhados, a cadeira vazia,
à noite, a manta alentejana dobrada e fria.
Tu eras o homem bom que não temia a morte,
apenas a imobilidade e o embaciamento dos dias,
que enfrentavas em busca dos caminhos de sol,
guiado sempre pela vontade férrea de caminhar
e fazer da simpatia da rua um altar.
Ah meu Pai…
a descontracção do teu sorriso faz-nos falta!
como uma chave que dá voltas e voltas,
neste músculo fechado e ferido que nos mantêm à tua espera.
Para o meu querido pai - Viriato José Guerreiro