terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

3 Cartazes à beira da estrada




Uma qualquer segunda-feira pelas 16:30

Estavam oito pessoas na pequena sala do cinema Monumental para assistir ao filme do momento do realizador Martin McDonagh. Sentei-me confortavelmente ao lado de uma cadeira que tinha um papel preso com fita-cola com o aviso de “avariado”, achei piada e descansei sobre ela o casaco e a mala e esperei que a cadeira se desmanchasse. Avariado por avariado, estava no lugar certo, pensei eu no esconso cantinho do cinema. Minutos depois o grande ecrã  ganhou animação e iniciou-se o terramoto vestido de comédia negra.

Vamos por partes:
O filme relata as manobras de uma mãe para não deixar cair no esquecimento o desaparecimento da filha, violada e assassinada à beira da estrada. Para tal, aluga três cartazes, situados precisamente nesse malfadado caminho, nos quais  manda inscrever um alerta. As palavras incisivas têm um destinatário. Mais concretamente, o respeitado xerife (Woody Harrelson), também ele a braços com um problema de difícil resolução. Inicia-se uma escalada de violência entre as autoridades e a estratégia de revolta maternal levada a cabo por Mildred, onde imperam diálogos fortes e actos cruéis. Já agora, o karma é "complicado", só para calar uma birra adolescente, que nunca ninguém ouse dizer a uma filha que espera que ela seja violada e azar dos azares...

A sombra do crime cobre a paisagem rural e suspende o tempo mas não a memória. A louca doçura maternal, tão ingénua quanto escondida, faz do sofrimento paródia e assim se avança. A busca do assassino processa-se de forma desajeitada e sem rumo, dando a entender que "alguém" tem interesse em que nada se descubra. 

Impressionante representação de Frances McDormand no papel da mãe Mildred. Cruel, engenhosa e maquiavélica, todavia com um sentido de humor fascinante e revelador de um coração solidário. Mas calma... nada de cenas de levar às lágrimas o calhau mais gelado. O filme acaba como se cortassem a luz do cinema e o projector abruptamente caísse aos trambolhões sobre as cadeiras avariando algumas cabeças. E num instante sai da sala com um alívio secreto para com os meus erros e defeitos. Afinal, existe culpa superior à minha, e ainda para mais, com uma estrada interminável pela frente.

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