quinta-feira, 26 de junho de 2025
Ilha do Sal e a miragem de Fata Morgana
sexta-feira, 13 de junho de 2025
O Homem que queria ser atacado por vaidade | Red-winged blackbird
Esta foi uma das aves que mais vi no Canadá. Destemido, confiante, de quando em vez, de peito feito e até agressivo. Numa caminhada por um parque, notei que esta ave atacava as pessoas que passavam no caminho, perto de uma árvore. Estranhei quando um senhor me pediu para tirar uma foto do pássaro bicando-lhe o chapéu, qual cena do filme de Hitchcock. Tirei algumas fotografias ao senhor radiante mediante o ataque do pássaro, quando fui avisado pelos meus amigos da existência de um ninho. O bicho apenas defendia a sua casa. Informei ao senhor de que o seu comportamento não seria o mais correcto, o senhor respondeu que não sabia do ninho e foi-se embora rabugento. O red-winged blackbird (agelaius phoeniceus) não me atacou, mas pedi-lhe, numa linguagem que fica entre o silêncio e o olhar, para que edificasse o seu ninho num local menos frequentado por parvos humanos.
terça-feira, 29 de abril de 2025
O apagão e a memória
(Às 11:33 o país apagou-se)
Junto à janela, o rádio a pilhas,
acompanhava as orações
da minha avó, de voz baixa,
da alma para o dedo,
ao toque do terço de tantas missas.
(Não temos internet, nem telefone!)
A minha avó, era uma mulher sábia,
dona e senhora dos almanaques de borda de água,
sabia as novenas e o nome dos locotores,
de voz solene e radiofónica em onda curta
e quanto à apanha da azeitona, líder de crise da geada.
(Península Ibérica sem eletricidade)
A minha avó não se deixava enganar
com as previsões meteorológicas,
nem com as pantominices políticas,
o peixe chegava uma vez por semana,
a minha avó nunca andou de avião.
(11 horas sem eletricidade, país incomunicável)
O candeeiro a petróleo e a lareira amarela
albergavam gatos adormecidos na lenha seca,
as torradas, o café da manhã, e a tenaz viva
removiam as cinzas e avivavam o fogo cansado,
lá fora, a necessidade roubava cor às rosas.
(O apagão não apaga a memória daqueles que já partiram)
terça-feira, 22 de abril de 2025
Apenas Francisco
O choro dorido dos sinos da igreja
anuncia a partida do Homem Bom,
entre Todos os outros, este respirava branco paz,
sorriso desafiante de esperança e fé na humanidade.
este Homem rezou e pediu perdão por nós
e nós não aprendemos com a vergonha das guerras,
nem com os ensinamentos da história,
e entregámos a ordem do mundo a loucos.
Será que estamos orfãos de luz?
sente-se o sabor da lágrima na chuva,
um dia depois dos céus da Páscoa,
renasce das pedras livres, apenas Francisco!
domingo, 20 de abril de 2025
365 dias depois da tua partida
Um ano depois,
não houve dia que não rememorasse
as nossas voltas, os diálogos nocturnos,
a complicidade do olhar entre o café matinal.
Mãe, por aqui, as flores desafiam ritmos,
continuo a governar a vida,
às vezes sem vontade nenhuma, outras...
com a pressa de incendiar a boca com o teu nome.
Indelével, nada apaga a tua falta,
nem as paredes caiadas de novos alfabetos
nem o piar mecânico do relógio de cama,
muito menos os comprimidos para adiar o desespero.
Hoje, na paz do cemitério, só se ouviam
as orações do vento e o cantar primaveril da saudade,
até que chegou uma senhora perto de mim e disse:
"Fique com Deus e boa Páscoa!"
humildemente retribui levantando-me deste chão.
sexta-feira, 21 de março de 2025
Tempestade Martinho
Os pássaros bem avisaram,
ao uivo da tempestade
38 anos de raízes
seriam arrancadas do chão.
a árvore tombou
e com ela a torre de líquenes,
as folhas em forma de barquinho
não impediram o naufrágio dos bichos.
aprendi a amar janelas
com árvores de chá para além das nuvens,
hoje, cortaram em pedaços o tronco,
ramos, braços, uma lasca do meu coração.
junto ao caixote do lixo do bairro,
amontoaram os ramos do cadáver desprezado,
os melros vestidos a rigor piavam e piavam
até ser noite outra vez.
sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025
Esgravatar
O húmus remexido pelos tordos
ilumina o rasto das centopeias maria-café
pelos escombros da terra húmida,
aproveito para plantar dedos em sangue
espero que daqui a uma vintena de palmos lunares
nasça um abraço.
quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025
Uma chamada que um dia chegará
Dificilmente ligarás do outro lado da morte
mas mantenho o aparelho ligado e com carga
suficiente para te ouvir dizer:
"bom dia, vou fazer sopas de café com leite."
quando o teu telemóvel extremece
espero que me digas - "vê-lá quem é!"
entretanto, acumulam-se alertas e mensagens,
promoções fantásticas e viagens.
deste lado respiro o teu número vivo
prolongamento deste fio de espera
até que nada mais seja necessário
sem corpo nem tempo seremos tudo.
10 meses depois da tua partida, minha querida Mãe!
sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025
Ar
Balões de ar quente puxam-te pelo
cabelo
aves necrófagas elevam-te e esticam-te os
braços
um dirigível fantasma rasga-te
o canto da boca
flutuas na atmosfera o
tempo necessário para cair
sejas tu sorriso ou canto de
lágrima.
sábado, 4 de janeiro de 2025
Idade não é um posto
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Nemoptera coa |
Os biólogos afirmam que o tubarão-da-gronelândia pode viver mais de 400 anos.
Este vertebrado atinge a maturidade sexual com 150 anos.
Por outro lado, a efémera, para além de ser um lindo insecto, vive apenas umas horas.
Estava a pensar nisto, sendo eu um trabalhador por contra de outrem,
enquanto calculava a idade da reforma das abelhas obreiras.
Desisto. Desisto do tempo mas sei que Ele não desiste de mim.
Ilha do Sal e a miragem de Fata Morgana
Eis uma miragem! Nestas fotografias, podemos observar um terreno árido acompanhado por um lago. Mas não. A água e o lago não existem, trat...
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Em Junho deste ano, quando estava a gravar a entrevista para a reportagem da Sic sobre o Parque Florestal de Monsanto , perguntaram-s...
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E assim dei por terminada a leitura destas páginas que me inquietaram durante mais de um ano. Debaixo do braço ou na mochila, transport...
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Durante vários anos andei à procura desta fantástica ave. Desde jardins em propriedade privada, cedidos amavelmente a título de empréstimo...