Hoje recordo o ano de 2008. Lembro-me de assistir a um concerto único, no passeio marítimo de Algés, onde um homem calmo e gentil entoava canções poemas numa voz grave e serena. De coração cheio e olhos lavados pelo vento, recordo aquelas horas que ficaram para sempre na minha memória. Tantas foram as vezes que aquela voz rouca e a poesia ofereceram inspiração aos meus humildes escritos. Em cima no palco, o homem tirava o chapéu e agradecia aos músicos e ao publico que o saudava em aplauso vivo, enquanto ele tratava todos por amigos. Amigos!
De céu cinzento a música toca na rádio. Não vale a pena aumentar o volume das sílabas. Não vai aproximar o eco da falta. Perplexo, fico imóvel e procuro um som grave na discografia que me ampara. Encontro um Homem capaz disso. Olho as fotografias que compõem o corpo do disco. De costas, um vulto segura uma guitarra. À sua frente estende-se uma paisagem de telhados velhos com segredos renovados e janelas por descobrir. Letras de canções e vidas. Talvez ainda hoje ele vá escrever ou cantar. Nunca se sabe as possibilidades que um génio tem para nos surpreender. Noutra fotografia ele toca na biqueira da bota e segue-nos de semblante sedutor com um cigarro na boca. Coisas simples. Por cima das nossas cabeças ele continua a falar-nos aos ouvidos.
Ainda não chove mas por certo que hoje será o dia mais indicado para isso. Daqui, deste canto de anonimato, continuo a aplaudir o homem que um dia me chamou amigo, tal como apelidou de amigos a milhares de pessoas, e assim ficámos amigos sem nunca nos conhecermos. Talvez seja esta a melhor forma de amizade.
Lá em cima, há um palco onde cantam homens de alma eterna e sonhadora e nós cá em baixo continuamos a ouvir o mar das suas palavras, enquanto a chuva se encarrega dos nossos dias.
Leonard Cohen
1934-2016
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